sábado, 1 de novembro de 2008

Adalberto Marcondes, Davi Molinari e Dida Sampaio: o papel do jornalista diante dos desafios da sustentabilidade

Por Fátima Cardoso, para o Instituto Ethos

O Notícias da Semana está publicando entrevistas com todos os vencedores do Prêmio Ethos de Jornalismo 2008. Finalizando a série, os entrevistados da semana são Davi Molinari, vencedor da categoria Internet, Dida Sampaio, da categoria Fotojornalismo, e Adalberto Marcondes, que recebeu o Prêmio Destaque Rede Ethos de Jornalistas.

Entrevista com Adalberto Marcondes

Instituto Ethos: A Envolverde completou dez anos em 2008. O que mudou na cobertura dos temas relativos a responsabilidade social e sustentabilidade nesse tempo?

Adalberto Marcondes: Começamos a trabalhar nos anos 1990, ainda com o conceito de jornalismo ambiental. Publicávamos temas relacionados à preservação do meio ambiente e à proteção dos ecossistemas e dos recursos naturais. Isso passou por uma evolução nestes últimos dez anos, quando foram incorporados conceitos mais amplos de sustentabilidade, nos quais meio ambiente é apenas uma parte da equação. Essa equação hoje tem três variáveis: a econômica, a social e a ambiental. A Envolverde incorporou as três variáveis da sustentabilidade de uma forma muito transversal em suas pautas. Não paramos de cobrir meio ambiente e passamos a cobrir sustentabilidade. Continuamos escrevendo sobre temas ambientais e sobre temas relacionados a educação, desenvolvimento humano e economia, só que com a transversalidade do olhar da sustentabilidade.

IE: Como o jornalismo pode contribuir para o desenvolvimento sustentável? Por que os jornalistas deveriam pensar suas pautas a partir do olhar da sustentabilidade?

AM: Acho que estamos vivendo aquilo que se define como sociedade da informação e do conhecimento, na qual a informação e o conhecimento têm valor. Vejo o jornalista como um profissional capaz de transitar nesse universo e fazer com que ele se torne compreensível para a sociedade. O jornalista tem hoje um papel muito mais relevante, no que se refere à estruturação de papéis na sociedade, do que jamais teve. No século 20, o jornalismo teve um papel importantíssimo para a consolidação da democracia nos principais países do mundo. As nações mais importantes têm hoje processos políticos democráticos estabilizados e é muito difícil imaginar que alguma dessas grandes democracias do mundo possa sofrer uma reversão. A partir daí, o jornalista e o jornalismo têm novos desafios. O desafio agora é o de mudar o paradigma do desenvolvimento, encarar desenvolvimento como um processo equilibrado, que pensa o presente e o futuro como partes da mesma equação. O futuro será conseqüência do que a gente faz no presente. O jornalista tem hoje o grande desafio - que eu acho maravilhoso - de olhar para o mundo de uma forma muito mais ampla, tendo não apenas o olhar no presente, mas também na dimensão da perenidade.

IE: O Prêmio Ethos de Jornalismo foi criado para estimular a mídia a abordar mais profundamente os temas da responsabilidade social e da sustentabilidade. Acha que esse objetivo está sendo cumprido?

AM: Acho que premiar e prestigiar pessoas que estão fazendo um trabalho coerente e conseqüente em relação à sustentabilidade é sempre uma forma de mostrar que elas estão no caminho certo. Até porque muitas vezes esses profissionais, ao longo de sua carreira, enfrentaram problemas para se manter nessa trajetória. Foram incompreendidos, tiveram problemas para defender pautas em suas redações, perseveraram e muitas vezes conseguiram conquistar espaços que, sem um esforço pessoal, não seria possível. O prêmio tem a característica de reconhecer um trabalho bem feito, um trabalho na direção correta, que precisa ser replicado cada vez mais.


Entrevista com Davi Molinari

Instituto Ethos: Você foi premiado pelas matérias publicadas no Portal Inovação Unicamp. Por que a inovação tecnológica é importante para o desenvolvimento sustentável?

Davi Molinari: A inovação tecnológica é a principal via para uma sociedade sustentável. O exemplo mais visível é a aplicação da tecnologia que permitiu o aumento da produtividade agrícola. Nos dois últimos séculos, a tecnologia tem evitado que a teoria populacional de Thomas Malthus ganhe efeito. Pela lógica malthusiana, o crescimento da população é geométrico, enquanto o dos alimentos é aritmético. Ocorre que hoje se produz mais por hectare do que no passado. De toda forma, coincidência ou não, a produção de alimentos e o desenvolvimento urbano são os principais fatores de desequilíbrio e pressão sobre a fauna e a flora. Isso me faz pensar que a sustentabilidade, no sentido mais amplo e de longo prazo, só será possível se for equacionado o ritmo de consumo de uma população crescente com o ritmo de produção de maneira geral. Ou seja, o consumo responsável aliado ao aumento da produtividade (mais produtos com menos matérias-primas ou em menos hectares) é a saída para o equilíbrio da vida no planeta, que tem recursos limitados. A consciência pode até diminuir o desperdício, mas só a tecnologia pode prover o equilíbrio.

IE: Que tipo de incentivo representa vencer o Prêmio Ethos de Jornalismo, sobretudo nesta edição, que reconhece o conjunto da obra?

DM: O Prêmio Ethos reconhece o caminho que o portal Inovação Unicamp tem trilhado. Sob o comando da jornalista Mônica Teixeira, o portal tem conseguido jogar luz sobre as iniciativas de pesquisas e desenvolvimento tecnológico, as quais, uma vez financiadas com dinheiro público, viram negócios social, econômica e ambientalmente sustentáveis. É um noticiário eletrônico que acompanha o resultado prático dos investimentos feitos pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), por meio do Programa de Inovação Tecnológica em Pequenas Empresas (Pipe). As reportagens têm revelado que os pesquisadores estão cada vez mais voltados para o desenvolvimento de tecnologias que se transformam em negócios sustentáveis. Quando vemos tais reportagens receberem o prêmio de jornalismo do Instituto Ethos, nós nos certificamos de que estamos no caminho certo. E não há incentivo melhor do que a indicação do caminho a percorrer.


Entrevista com Dida Sampaio

Instituto Ethos: Você foi premiado por trabalhos relativos ao desmatamento e à Amazônia, mas seu cotidiano no jornal O Estado de S.Paulo, em Brasília, é na cobertura de pautas em política e economia. O que o levou a se interessar por reportagens sobre a sobre a floresta?

Dida Sampaio: Passei a cobrir a Amazônia para ajudar a preservá-la, para que as gerações futuras também possam usufruir dela e conhecê-la, porque, nesse ritmo de desmatamento, ela não vai durar muito tempo. A intenção de ir lá, ver, denunciar os abusos e a destruição na sua forma mais ampla é gerar uma discussão e, a partir disso, chegar a um denominador comum, que é preservar e atingir a sustentabilidade.

IE: Quais são as dificuldades de fazer esse tipo de cobertura num ambiente totalmente diferente daquele ao qual você está acostumado?

DS: Para falar de Amazônia, é preciso conhecer a Amazônia. É muito complicado chegar lá. Tem de ter uma logística, pois a floresta é muito adversa ao jornalista. Poucas pessoas querem ir à Amazônia para fazer matérias. É mais fácil ficar nos gabinetes com ar condicionado e tapetes vermelhos, fotografar rainhas e princesas, do que colocar o pé na lama e tomar chuva. Durante uma viagem de trinta dias à Amazônia, eu e o jornalista Lourival Sant?Anna percorremos lugares, conhecemos as pessoas e acompanhamos o drama delas. Numa vila, encontramos uma senhora que tinha perdido o filho quatro dias antes, por malária. E o outro filho dela, o caçula, também estava doente. Então tivemos de mudar nossa viagem e antecipar a volta para poder dar carona a essa mulher, no nosso barquinho pequenininho, para poder tirá-la daquela região, porque lá não tinha remédio para tratar a doença.

IE: Vencer o Prêmio Ethos de Jornalismo significa dar mais repercussão ao seu trabalho?

DS: Mais importante do que vencer é levar esse prêmio para uma discussão do meio ambiente, da sustentabilidade. Eu sou apenas um instrumento. Fico feliz de vencer, sem dúvida, mas fico mais feliz ainda em saber que os jornais estão publicando matérias sobre esses temas e que há jornalistas ganhando prêmios nessa área.


(Envolverde/Instituto Ethos)

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